Quiet, quiet, quiet

Luciana Colnaghi - Diretora de Planejamento da Agência Frat

Quiet quitting. Quiet firing. Quiet ambition. Nos últimos tempos tenho lido sobre várias tendências de comportamento no mercado de trabalho e o que elas têm em comum é uma atitude pouco ativa quanto a uma intenção: demissão silenciosa (por parte do colaborador), demissão silenciosa (por parte da liderança), ambição silenciosa. Isso faz com que uma pergunta emerja para se pensar no trabalho hoje: por que estamos tão quietos?

Essas tendências indicam que algo mudou na relação das pessoas com o trabalho e isso está impactando produtividade, motivação, comprometimento e felicidade delas no trabalho.

Líderes precisam estar atentos a isso e entender o porquê e para onde caminhamos. Para isso é preciso compreender que historicamente o trabalho ocupou lugares muito diferentes na subjetividade e na vida das pessoas, e que atualmente talvez estejamos chegando a um novo momento.

Na antiguidade, o trabalho era um castigo. Mais recentemente, na idade moderna, o trabalho passou a ser visto como uma virtude. O sociólogo alemão Max Weber aponta a religião como elemento fundamental no processo de valorização do trabalho. Em sua obra “A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo”, o autor aponta que os protestantes consideravam a dedicação ao trabalho como uma virtude e que essa visão ajudou o capitalismo a ter sucesso em países protestantes.

Essa virada de percepção também ocorre quando o indivíduo tem a consciência que detém o poder de satisfazer suas necessidades com o fruto do seu trabalho, entendendo “necessidade” não só como sua subsistência, mas também seu lazer, sua satisfação pessoal, seus anseios, a parte subjetiva. Nesse ponto podemos parar para pensar se as pessoas não estão vendo mais o trabalho como um meio para se satisfazer.

E hoje? Qual ou quais aspectos marcantes da nossa subjetividade estão impactando a forma como nós, e especialmente as novas gerações, interagem com o profissional? Vivemos um momento de duas características onipresentes:  a felicidade obrigatória e o imediatismo.

A felicidade, dissimulada ou não, é expressa o tempo todo nas redes e estabelecimentos se preparam para serem o cenário perfeito de um clique de felicidade, já seu oposto, a infelicidade é cada vez mais medicalizada. O imediatismo, também óbvio nas redes sociais, tem uma outra camada mais profunda: a dúvida sobre o futuro. Hoje não sabemos mais quando será possível comprar uma casa, quando ou se vamos nos aposentar ou qual será a realidade futura em um planeta em colapso climático.

A combinação desses dois fatores é bombástica para o mundo do trabalho. Se simplificarmos bastante, houve um tempo em que o mundo do trabalho “vendia” uma ideia só para todos: trabalhar consistentemente durante um período longo de sua vida, apresentar boa performance, ganhar mais dinheiro, ocupar uma posição de prestígio etc.

Mas hoje, com as incertezas futuras, essa promessa “one size fite all” não está funcionando mais. Ou seja, as pessoas querem uma recompensa agora e essa recompensa pode ser genericamente definida como felicidade. Realizações maiores exigem planejamento e uma aposta em um futuro, mas isso é cada vez menos uma opção para uma geração cheia de incertezas, mas a sensação de felicidade pode tomar diversas faces.

Acho que é possível voltar ao ponto inicial: estamos tão quietos no trabalho porque a promessa do mundo profissional não tem mais significado no mundo em que se vive. Nesse contexto, novos formatos de trabalho e novas negociações se fazem necessárias para que o engajamento da equipe aconteça. Segundo pesquisas (Infojobs e Grupo Top RH), é crescente a busca dos profissionais por home office, o que evidencia a necessidade de conciliar o trabalho com aspectos da vida pessoal.

Comportamentos como engajamento e colaboradores menos “quiet” estão atrelados às possibilidades de trabalhos que permitam viver mais aspectos da vida junto do trabalho (já que não é possível abrir mão de um período da vida devido promessas futuras em um mundo de incertezas).

Assim, é preciso mostrar a possibilidade de realizações menores mais próximas, mais do que algo no longo prazo, e isso pode se materializar em diversas possibilidades: trabalhar e viajar ao mesmo tempo, trabalhar e estar com seu pet, trabalhar e não ficar longe dos filhos, benefícios imediatos etc. Dessa forma, falamos muito de como as empresas devem se preparar para o futuro, mas também é preciso que elas estejam prontas para o “agora” pelo qual todos anseiam.